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Afasta de mim este cale-se: a garantia da palavra do Parlamento
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04/01/2023 - 18:53
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“A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade” – Rui BarbosaHouve, enfim, em 16 de dezembro de 2022, o abraço pelo Supremo Tribunal Federal àtese exaustivamente defendida pela Procuradoria-Geral da Assembleia Legislativa deMato Grosso, durante a gestão do deputado Eduardo Botelho no ano de 2019, na épocaem que tive a honra de chefiá-la – a noção, simples mas basilar, de que o respeito ereverência às deliberações dos representantes diretos do povo perpassa o respeito àssuas prerrogativas inscritas tanto na Constituição Estadual quanto na própriaConstituição Federal (§ 1º do art. 27).
Sabe-se que a palavra pode ser aparato de calúnia, de difamação, de injúria. Pode,contudo, ter também o poder de defender, de restaurar, de preservar. A palavra é, porisso, a espada tanto do advogado (defendendo, restaurando e preservando direitos)quanto do legislador (defendendo, restaurando e preservando a democracia).
Em regra, preservam-se os direitos do advogado de defender direitos por meio daatuação legislativa, enumerando prerrogativas e deveres, como na Lei Federal 8.906/94(Estatuto da OAB). Curiosa, contudo, a situação na qual a palavra do advogado énecessária para preservar a palavra do legislador.
À vista disso, a ADI n° 5825 questionava dispositivos da Constituição Estadual (§§ 2º a5º do art. 29 da Constituição do Estado do Mato Grosso, com a redação da EC n. 42/06)que asseguravam a garantia parlamentar de deliberar acerca da prisão de seusmembros, em sintonia com a Constituição Federal (§§ 2º a 5º do art. 53), a fim de evitartendências ditatórias e antidemocráticas partindo de outros Poderes.
A ação em si já configurava um ataque a uma prerrogativa fundamental de qualquerdemocracia contemporânea. A procedência da ação significaria um significativomenosprezo à liberdade parlamentar e às prerrogativas de seus membros. Tolher-se-iaa o irrestrito respeito à palavra do parlamentar – palavra esta garantidora da democracia.Após, então, uma atuação intransigente em defesa da ALMT, foi posto um ‘basta’ aomenoscabo ao parlamento. In casu, a palavra dos advogados legislativos asseguroutanto a permanência e o respeito à palavra dos legisladores (a EC n. 42/06) quanto àspalavras futuras dos deputados estaduais de Mato Grosso, que poderão atuar semmedo de sofrerem represálias não-republicanas.
É claro que foram sombrios e taciturnos os momentos vividos até que houvesse aconsagração da língua do justo, aquela do Provérbio bíblico 10:20. O mencionadoprovérbio consegue abarcar a relevância e a proteção que o julgado proporciona àrealidade estadual e, quiçá, à conjuntura nacional como uma nova e magnânimareferência.
De fato, "a prata escolhida é a língua do justo", já que na conjuntura não haveria outrapostura possível quando se carrega a virtuosidade e a coragem nas costas. Para o justo,"o coração dos ímpios é de nenhum preço". Ou seja, é inescusável garantir aconsagração da justiça em todas as atitudes humanas possíveis.
Entristece, todavia, que, por mais que o respeito ao parlamentar estadual deva serquestão comezinha, foi necessário tanto esforço por parte da Procuradoria-Geral paraver respeitada, no Judiciário, a deliberação do Legislativo. Há de se parabenizar osministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, AndréMendonça, Nunes Marques e (embora por motivos formalísticos) Edson Fachin, querespeitaram o parlamento mato-grossense e assentaram a constitucionalidade daConstituição Estadual.
Por fim, reafirmamos nosso compromisso solene: não abrimos e nunca abriremos mãode uma intransigente defesa da ALMT e das prerrogativas democráticas dos deputadosestaduais. Restou no passado tempos em que se aplaudia a prisão parlamentar sem odevido processo político-constitucional. Nunca mais! Melhor “correr perigo com o queera justo, que, por medo da morte e do cárcere, concordar com o injusto” (Socrátes).Grhegory Paiva Pires Moreira Maia é procurador de carreira da Assembleia Legislativade Mato Grosso, atual consultor jurídico geral do Tribunal de Contas do Estado de MatoGrosso, doutorando em Direito Constitucional.
Ricardo Riva é procurador de carreira da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, atualprocurador-geral da ALMT.