Mesmo sinalizando que não há uma crise de relacionamento, mas deixando margem a interpretações diversas, o prefeito de Cuiabá, Abílio Brunini (PL), baixou o Decreto 11.310/2025, que estabelece como prerrogativa exclusiva do chefe do Executivo a representação do Município junto a órgãos e autoridades federais e estaduais.
Curiosamente, a medida foi adotada 24 horas depois de a vice-prefeita Vânia Rosa (Novo) ter declarado à imprensa, durante visita à Assembleia Legislativa, na quarta-feira (17), que estava buscando novas interlocuções para que a Capital de Mato Grosso fosse mais bem contemplada com políticas públicas,
A decisão, na prática, desautoriza a vice-prefeita e novamente provoca o confronto com ela, que, agora, exerce apenas o mandato para o qual foi eleita, mas de forma esvaziada, pois quase nenhuma condição lhe é ofertada para qualquer tipo de atividade.
“Esse é um papel do prefeito estabelecido pela Lei Orgânica”, disse Abílio, em sua rotineira visita à Câmara Municipal, nos dias de sessão ordinária, em uma clara demonstração do patrulhamento que faz perante as demais autoridades de sua gestão, independentemente de serem aliadas ou não.
O prefeito declarou que o decreto não se referia apenas a Vânia Rosa, com quem já teve desentendimentos que chegaram envolver até a Polícia Militar de Mato Grosso e o registro de um B.O. (Boletim de Ocorrência), durante um fim de semana, na sede da Secretaria de Mobilidade Urbana (Sempb), que, à época, era conduzida pela vice-prefeita.
Segundo ele, "alguns secretários" estariam extrapolando suas atribuições, deixando latente que o papel da interlocução pertence (como se ele fosse proprietário) a quem foi eleito, prefeito de Cuiabá - no caso, ele.
Na semana passada, a vice-prefeita - que é coronel da reserva da PM - defendeu que a gestão do Palácio Alencastro passe a articular melhor com o Governo do Estado e, principalmente, com o Governo Federal.
O objetivo, segundo ela, é garantir mais recursos para a Capital, num momento em que o caixa da Prefeitura tem saldo altamente negativo.
Vânia Rosa acha que o Governo Municipal tem que deixar de lado a questão ideológiica e abrir um canal de entendimento, até mesmo, com o Governo Lula (PT).
O extenso decreto, que foi publicado Gazeta Municipal (veja íntegra no fim desta matéria), reflete a vontade implícita do prefeito de mostrar que é ele quem manda. Revela, ainda, que ele se se incomoda com qualquer ato que não seja autorizado - tem que passar primeiro pelo seu crivo e que seja cumprindo o script definido por ele.
Altamente centralizador desde sua posse, Abílio Brunini exerce, na plenitude, não um mandato eletivo, mas sim, uma espécie de reinado, ao colocar no decreto, sempre tendo o cuidado de não ferir a parte legal (no caso previsto, os procuradores municipais, que têm prerrogativas em lei), que é maior que sua vontade; que pode autorizar agentes públicos a representarem Cuiabá dentro dos limites inseridos em sua ordem.
O decreto vai ainda mais longe ao considerar que fica vedado a qualquer servidor ou agente público municipal "avocar para si ou exercer, sem a devida delegação formal, a atribuição de representação do Município perante entes ou autoridades federais e estaduais", sob pena de responsabilização administrativa, civil e penal.
Ou seja, o próprio prefeito não se revela satisfeito com o próprio decreto, e já alertou que desrespeitá-lo pode levar a sanções judiciais.
Argumentando que o interesse é organizar e impedir que passe a existir "insegurança jurídica" no trato da coisa pública, Abílio assinalou que colocar ordem na casa é sempre bom.
Leia na íntegra o polêmico decreto:
DECRETO Nº 11.310, 17 DE SETEMBRO DE 2025
DISPÕE SOBRE A REPRESENTAÇÃO DO MUNICÍPIO DE CUIABÁ PERANTE ENTES E AUTORIDADES FEDERAIS E ESTADUAIS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
O PREFEITO MUNICIPAL DE CUIABÁ, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo art. 68, inciso VI, da Lei Orgânica do Município de Cuiabá, e
CONSIDERANDO que a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 18, assegura a autonomia dos Municípios;
CONSIDERANDO que o Chefe do Poder Executivo Municipal é o representante máximo do Município, a quem compete, nos termos da legislação vigente, manifestar a vontade da pessoa jurídica de direito público que representa;
CONSIDERANDO a necessidade de se estabelecer um fluxo de comunicação e representação oficial uniforme, coeso e alinhado com as diretrizes estratégicas da gestão municipal nas relações intergovernamentais;
CONSIDERANDO que a centralização da representação externa do Município na figura do Prefeito ou de agente por ele formalmente delegado otimiza a defesa dos interesses de Cuiabá perante as esferas de governo federal e estadual;
CONSIDERANDO o que dispõe a Lei Orgânica do Município de Cuiabá sobre as competências privativas do Prefeito para a prática de atos de administração e representação do Município;
CONSIDERANDO que a avocação indevida da prerrogativa de representação por agentes não autorizados pode gerar insegurança jurídica, conflitos de competência e prejuízos à administração pública municipal;
CONSIDERANDO, por fim, a imperiosa necessidade de se resguardar a prerrogativa constitucional e legal do Chefe do Poder Executivo de representar o Município em juízo e fora dele, em todas as suas relações com outros entes e autoridades;
DECRETA:
Art. 1º A representação do Município de Cuiabá, bem como todos os diálogos e tratativas com órgãos e autoridades da União e do Estado de Mato Grosso e de qualquer outra unidade da Federação, será exercida única e exclusivamente pelo Prefeito Municipal.
Parágrafo único. A representatividade descrita no caput deste artigo não afasta a competência prevista em lei da Procuradoria-Geral do Município e de seus membros.
Art. 2º A prerrogativa de que trata o art. 1º poderá ser delegada pelo Prefeito Municipal a Secretários Municipais ou a outros servidores públicos, mediante ato formal e específico, que delimitará o objeto e o alcance da delegação.
Parágrafo único. A delegação de competência será sempre exercida nos limites fixados no ato de delegação e não poderá ser subdelegada, salvo com autorização expressa do Chefe do Poder Executivo.
Art. 3º Fica vedado a qualquer servidor ou agente público municipal avocar para si ou exercer, sem a devida delegação formal, a atribuição de representação do Município perante entes ou autoridades federais e estaduais, sob pena de responsabilização administrativa, civil e penal.
Art. 4º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.
Gabinete do Prefeito Municipal de Cuiabá, em 17 de setembro de 2025.
ABILIO JACQUES BRUNINI MOUMER
Prefeito de Cuiabá
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