Enquanto na Transpantaneira em MT bichos ficam a salvo de atropelamentos, rodovia asfaltada que cruza Pantanal do MS vira “cemitério” da fauna

Redação   A falta de pavimentação na rodovia estadual Transpantaneira, uma estrada parque  que liga Poconé a Porto Jofre (na divisa com MS), ao contrário de representar atraso, é na verdade um avanço ambiental por dificultar que veículos transitem em alta veolcidade, o que poderia provocar atropelamentos e matança de animais da fauna pantaneira.  A Transpantaneira começou a ser construída há mais de quatro décadas, no governo de José Fragelli, e seu traçado inicial era para ligar Cuiabá (via Poconé) a Corumbá, no Mato Grosso do Sul, mas encerrou seu trajeto na margem de cá do Rio Paraguai, em Porto Jofre, território mato-grossense.Esse cenário de uma estrada de chão permite que turistas e visitantes que transitam pelo local possam contemplar bandos de capivaras, pastando nas margens da rodovia e atravessando tranquilamente a pista de um lado a outro, além de jacarés e uma enormidade de aves e, com  sorte, pode-se deparar com uma onça pintada ou parda.Essa mesma situação de se ver a fauna relativamente protegida de motoristas mais “apressados” já não ocorre no vizinho Estado do Mato Grosso do Sul, onde pistas asfaltadas cortam o Pantanal, um ecossistema frágil e no qual o "progresso" representado pelo asfalto pode apressar a sua extinção.Nesse sentido, para tentar resguardar a vida dos bichos, o Ministério Público Federal (MPF) em Corumbá (MS) ajuizou ação civil pública para que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) cumpra "diversas condicionantes" da licença ambiental da BR-262, no trecho entre Aquidauana e Corumbá, no pantanal sul-mato-grossense, para assegurar proteção da fauna e também a segurança do tráfego. As informações foram divulgadas pela Procuradoria em Mato Grosso do Sul. Embora as obras da estrada tenham sido finalizadas, as obrigações assumidas pelo DNIT na Licença de Instalação nº 733/2010 "continuam sendo descumpridas", segundo a Procuradoria. As medidas do Ministério Público Federal visam conter a alta mortalidade de animais silvestres ao longo da BR-262, que cruza o País no sentido leste-oeste e interliga os Estados do Espírito Santo, Minas, São Paulo e Mato Grosso do Sul, chegando até Corumbá, na fronteira do Brasil com a Bolívia. No trecho em que atravessa o pantanal sul-mato-grossense, entre Aquidauana e Corumbá, a BR-262 ostenta o título de estrada mais letal do Brasil para a fauna silvestre, destaca a Procuradoria. O pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul Wagner Fischer monitora, há 20 anos, aquele trecho de estrada, classificando-a, em relação à vida selvagem, como "a mais mortal no Brasil e uma das mais mortais do mundo". A recente estimativa de Fischer e seus colegas da UFMS é de que, entre atropelamentos reportados e não reportados, o número já ultrapasse 3 mil mortes por ano, que atingem até 88 espécies de animais silvestres, entre elas algumas ameaçadas de extinção, como o macaco prego e o cervo do pantanal. Segundo informações divulgadas pela Procuradoria, o DNIT chegou a promover algumas medidas para diminuir a mortalidade da rodovia, como a instalação de radares e sinalização horizontal e vertical (placas) nos trechos mais críticos. Essas medidas, porém, "não foram suficientes para conter o problema, e ainda estão pendentes as obrigações de instalação de cercas para passagem de fauna e outras medidas previstas na licença ambiental". Em 18 de junho de 2018, o Ministério Público Federal expediu Recomendação para que o DNIT "adotasse todas as medidas necessárias para atender as recomendações do Ibama". O DNIT alegou restrições orçamentárias para o descumprimento, segundo a Procuradoria. Para o MPF, "não é a simples alegação de ausência de recursos, destituída de qualquer comprovação nesse sentido, ou de outra que corrobore a impossibilidade da aplicação orçamentária na prestação de um direito fundamental, que impeça a implementação deste direito". Pedidos à Justiça O Ministério Público Federal pede liminar à Justiça "obrigando o DNIT a retomar imediatamente o serviço de limpeza sistematizada de 7 metros, a partir do acostamento, ao longo de todo o trecho da rodovia, de forma a evitar a ocupação (abrigo, reprodução e alimentação) da fauna local neste perímetro". A multa diária por descumprimento deve ser de no mínimo R$ 1 mil, sugere a Procuradoria. A ação pede ainda à Justiça, na decisão final, a condenação do DNIT à instalação de duas cercas de proteção e condução de passagens inferiores de fauna pelas pontes de vazantes, obra que deverá ser acompanhada pelo Ibama. Pede também condenação à instalação de 60 metros de cercas de proteção e condução de passagens inferiores de fauna, bem como defensas metálicas para cada uma delas, pelas pontes de vazantes do Córrego Acogo, Córrego Laranjal, Córrego Agachi, Córrego Bananal, Córrego Rio Verde e Córrego das Pedras; instalação de duas passagens superiores de fauna, uma no km 734 e uma no km 755, destinada à redução dos riscos de atropelamento da espécie Sapajus Cay, o popular Macaco-Prego. O MP pede ainda: realocação de dois radares, um entre os quilômetros 577 e 578 e outro entre os quilômetros 739 e 740, além da instalação de dois novos radares, um no km 624,5 e um no km 680,5, destinados à redução dos riscos de atropelamento da espécie Blastocerus Dichotomus, popular Cervo-do-Pantanal; e apresentação de novo cronograma de execução dos trabalhos, de forma a contemplar prazo razoável para as exigências. Após a instalação de todos os dispositivos de proteção da fauna, o Programa de Monitoramento de Atropelamentos de Fauna na BR-262 terá de, obrigatoriamente, ter continuidade.