“A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade” – Rui Barbosa
Houve, enfim, em 16 de dezembro de 2022, o abraço pelo Supremo Tribunal Federal à
tese exaustivamente defendida pela Procuradoria-Geral da Assembleia Legislativa de
Mato Grosso, durante a gestão do deputado Eduardo Botelho no ano de 2019, na época
em que tive a honra de chefiá-la – a noção, simples mas basilar, de que o respeito e
reverência às deliberações dos representantes diretos do povo perpassa o respeito às
suas prerrogativas inscritas tanto na Constituição Estadual quanto na própria
Constituição Federal (§ 1º do art. 27).
Sabe-se que a palavra pode ser aparato de calúnia, de difamação, de injúria. Pode,
contudo, ter também o poder de defender, de restaurar, de preservar. A palavra é, por
isso, a espada tanto do advogado (defendendo, restaurando e preservando direitos)
quanto do legislador (defendendo, restaurando e preservando a democracia).
Em regra, preservam-se os direitos do advogado de defender direitos por meio da
atuação legislativa, enumerando prerrogativas e deveres, como na Lei Federal 8.906/94
(Estatuto da OAB). Curiosa, contudo, a situação na qual a palavra do advogado é
necessária para preservar a palavra do legislador.
À vista disso, a ADI n° 5825 questionava dispositivos da Constituição Estadual (§§ 2º a
5º do art. 29 da Constituição do Estado do Mato Grosso, com a redação da EC n. 42/06)
que asseguravam a garantia parlamentar de deliberar acerca da prisão de seus
membros, em sintonia com a Constituição Federal (§§ 2º a 5º do art. 53), a fim de evitar
tendências ditatórias e antidemocráticas partindo de outros Poderes.
A ação em si já configurava um ataque a uma prerrogativa fundamental de qualquer
democracia contemporânea. A procedência da ação significaria um significativo
menosprezo à liberdade parlamentar e às prerrogativas de seus membros. Tolher-se-ia
a o irrestrito respeito à palavra do parlamentar – palavra esta garantidora da democracia.
Após, então, uma atuação intransigente em defesa da ALMT, foi posto um ‘basta’ ao
menoscabo ao parlamento. In casu, a palavra dos advogados legislativos assegurou
tanto a permanência e o respeito à palavra dos legisladores (a EC n. 42/06) quanto às
palavras futuras dos deputados estaduais de Mato Grosso, que poderão atuar sem
medo de sofrerem represálias não-republicanas.
É claro que foram sombrios e taciturnos os momentos vividos até que houvesse a
consagração da língua do justo, aquela do Provérbio bíblico 10:20. O mencionado
provérbio consegue abarcar a relevância e a proteção que o julgado proporciona à
realidade estadual e, quiçá, à conjuntura nacional como uma nova e magnânima
referência.
De fato, "a prata escolhida é a língua do justo", já que na conjuntura não haveria outra
postura possível quando se carrega a virtuosidade e a coragem nas costas. Para o justo,
"o coração dos ímpios é de nenhum preço". Ou seja, é inescusável garantir a
consagração da justiça em todas as atitudes humanas possíveis.
Entristece, todavia, que, por mais que o respeito ao parlamentar estadual deva ser
questão comezinha, foi necessário tanto esforço por parte da Procuradoria-Geral para
ver respeitada, no Judiciário, a deliberação do Legislativo. Há de se parabenizar os
ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, André
Mendonça, Nunes Marques e (embora por motivos formalísticos) Edson Fachin, que
respeitaram o parlamento mato-grossense e assentaram a constitucionalidade da
Constituição Estadual.
Por fim, reafirmamos nosso compromisso solene: não abrimos e nunca abriremos mão
de uma intransigente defesa da ALMT e das prerrogativas democráticas dos deputados
estaduais. Restou no passado tempos em que se aplaudia a prisão parlamentar sem o
devido processo político-constitucional. Nunca mais! Melhor “correr perigo com o que
era justo, que, por medo da morte e do cárcere, concordar com o injusto” (Socrátes).
Grhegory Paiva Pires Moreira Maia é procurador de carreira da Assembleia Legislativa
de Mato Grosso, atual consultor jurídico geral do Tribunal de Contas do Estado de Mato
Grosso, doutorando em Direito Constitucional.
Ricardo Riva é procurador de carreira da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, atual
procurador-geral da ALMT.