Por Mário Marques de Almeida
Já está passando da hora da democracia brasileira deixar de conviver com intimidações milicianas, a exemplo do que ocorre na atualidade. Faltam mais vozes e ações na defesa intrasigente de postulados republicanos e instituições que enfrentam ameaças, a exemplo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), frequentemente “bombardeado” por Bolsonaro e bolsonaristas, com uma fúria que, para muitos, é uma atitude insana, mas, bem pior, por que esconde o objetivo de vir a não reconhecer uma eventual (e bastante provável) derrota do “mito” nesta eleição de 2022. Preparando, assim, o terreno para um possível golpe contra a transferência do poder.
Nesse indigesto “cardápio” de ataques antidemocráticos e de endeusamento de torturadores, chegam a defender o retorno da ditadura militar, não faltando mesmo a “glorificação”, através da publicação e leitura de “ordens do dia” emitidas por altas autoridades militares, do período que ficou conhecido historicamente como “anos de chumbo” e de escuridão.
Durante o qual até um surto de meningite chegou a ser ocultado da população brasileira, o que ocasionou muitas mortes, principalmente de crianças e cujos óbitos poderiam ser evitados se as informações sobre a doença tivessem circulado. Além de prisões sem culpa formada, torturas e desaparecimentos de pessoas que se postavam contra o regime ditatorial.
Nesse contexto de adotar em seus escritos uma postura democrática e corajosa, louvo, aqui desta coluna do Página Única, o veterano jornalista Gilberto Menezes Côrtes, que publica seus artigos (verdadeiras aulas de economia e política), na versão online do Jornal do Brasil. Além de um texto primoroso, ele tem a capacidade de sacudir a letargia e a ignorância que toma conta da memória de milhões de brasileiros que não se dão conta - e até quando vai perdurar a “amnésia” ? - que a democracia brasileira anda no “fio da navalha”, ameaçada por surtos golpistas, convivendo com ataques sistemáticos e recorrentes à legalidade, segurança e legitimidade das eleições.
De um dos artigos mais recentes de Menezes Côrtes, retiro dois trechos que considero emblemáticos da atual situação do Brasil.
Leia
“...Os militares esquecem da parte final, da ruína que foram os seis anos do governo do general João Batista de Figueiredo, oficial de cavalaria e antecessor de Newton Cruz no comando do SNI, que dizia “preferir o cheirinho dos cavalos ao cheiro do povo”. O país terminou quebrado, recorrendo ao Fundo Monetário Internacional para renegociar a dívida externa. E a inflação tinha saltado dos 46% ao ano em março de 1979, quando Figueiredo assumiu, para 220% em março de 1985, quando se recusou a entregar a faixa presidencial ao vice-presidente José Sarney, eleito com Tancredo Neves, que teve de ser operado na véspera da posse e morreu sem assumir o poder...”
“O mal explicado episódio da compra de 35 mil comprimidos de Viagra pelas Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) continua mal explicado e servindo para toda a sorte de memes e piadas jocosas. A explicação mais plausível é de que os comprimidos da Pfizer (cujas ofertas de vacinas para a Covid-19 foram solenemente ignoradas por Jair Bolsonaro e seu 3º ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello, seriam fornecidos pelas farmácias das três armas a oficiais da reserva ou aos mais idosos da ativa. Mas os da ativa não querem assumir que estariam inativos e preferem tirar da bula a explicação de os comprimidos seriam utilizados para combater hipertensão pulmonar. Conta outra, que esta não cola. Não seria melhor dizer que tudo não passa do saudosismo da dita dura... Ou ir no cerne da questão: o que há não é disfunção erétil nem hipertensão pulmonar, mas uma crônica disfunção democrática.”
*Mário Marques de Almeida é jornalista em Cuiabá. É um dos decanos da Imprensa mato-grossense e edita o site e jornal Página Única