Radicalismo ideológico de Bolsonaro e temperamento “mercurial” pode levá-lo a interagir apenas com a extrema-direita, avalia especialista

RedaçãoO episódio em que o presidente Jair Bolsonaro “fritou” o economista Joaquim Levy, ameaçando demiti-lo da presidência do BNDES, expondo o subordinado a humilhações públicas, do tipo estou “por aqui” referindo-se ao assessor e afirmando que o mesmo estava com "a cabeça a prêmio”,  causou preocupação nos meios econômicos e financeiros – não propriamente pela demissão de Levy - , mas pela forma como Bolsonaro age. Deixando à mostra um temperamento mercurial, intempestivo e que transmite insegurança na própria equipe de governo. O fato, obviamente, extropla os limites internos da administração federal e se espraia pelo mercado.Essa preocupação é externada pelo cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marco Antonio Carvalho Teixeira, que afirmou neste domingo, 16, que a postura do presidente Jair Bolsonaro de se meter em "bolas divididas", como no caso da demissão de Joaquim Levy, pode levar o governo a perder protagonismo em questões como a reforma da Previdência. "Não sabemos o futuro do governo desse jeito. O governo perdeu capacidade de articulação e a impressão que tenho é que o protagonismo em relação à reforma da Previdência vai sair do Congresso e não do governo", afirmou Teixeira. "Me parece que o governo não tem capacidade de trabalhar com o consenso, além de ser pouco talhado a conviver em um ambiente democrático." Para o cientista político, o governo "está caminhando desse jeito para dialogar com um público ainda mais reduzido, de extrema-direita". "Esse é um movimento contraditório e revela que o presidente faz e fala o que vem em sua cabeça", comentou. Levy pediu demissão da presidência do BNDES neste domingo, após ser criticado pelo pesidente Jair Bolsonaro por conta da nomeação de Marcos Barbosa Pinto para o cargo de diretor de Mercado de Capitais no banco. Incomodado com a escolha, Bolsonaro disse que Levy estaria "com a cabeça a prêmio". Barbosa Pinto trabalhou como assessor no BNDES entre 2005 e 2007, no governo PT, fato que irritou Bolsonaro. Mas o próprio Levy foi ministro da Fazenda durante o governo Dilma Rousseff.Diante da situação cpnstrangedora a que ficou exposto, Joaquim Levy não teve outra saída a não ser pedir demissão da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) depois de cinco meses no cargo. Na administração pública, ele já havia ocupado postos-chave nos governos de Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Um "Chicago boy" assim como o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, Levy é um nome conhecido do mercado - ele já foi diretor geral e financeiro do Banco Mundial entre 2016 e 2018 e diretor superintendente do Bradesco entre 2010 e 2014. Economista ortodoxo, ele possui doutorado pela Universidade de Chicago, considerado centro do pensamento liberal. No governo de Bolsonaro, sua nomeação foi tida como um sinal de vitória dessa visão econômica sobre o pensamento um pouco mais estatizante do núcleo militar. O estopim da demissão de Levy foi a nomeação do advogado Marcos Barbosa Pinto para o cargo de diretor de Mercado de Capitais do BNDES. Barbosa Pinto trabalhou como assessor do banco de fomento durante o governo petista, de 2005 a 2007, o que irritou Bolsonaro. No entanto, o próprio Levy foi ministro da Fazenda de Dilma Rousseff em 2015, e também trabalhou no governo de Lula entre 2003 e 2006. A presidente cassada Dilma anunciou Levy para o ministério da Fazenda em novembro de 2014, parte de uma equipe econômica montada para fazer um aceno ao mercado. O economista ortodoxo assumiu o posto com um plano austero de ajuste fiscal. No entanto, ele ficaria menos de um ano no cargo: foi demitido em dezembro de 2015 após enfrentar resistência do PT e o fogo amigo do governo. A saída de Levy já tinha sido acertada com Dilma mais de uma vez. O ex-ministro da Fazenda já tinha ficado conhecido como "mãos de tesoura" em sua primeira passagem em um governo petista, entre 2003 e 2006, quando foi secretário do Tesouro Nacional na gestão de Lula e teve como missão em ordem as contas do governo. Com a entrada de Guido Mantega na Fazenda, Levy deixou o ministério para assumir a vice-presidência de Finanças e Administração do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), cargo que ocupou em 2006. Levy assumiu em 2010 a diretoria de gestão estratégica da Bradesco Asset Management (Bram). Sua primeira passagem por um governo foi em 2000, quando foi economista-chefe da Assessoria Econômica do Ministério do Planejamento de Fernando Henrique Cardoso. Ele foi mantido no processo de transição entre o governo FHC e Lula.